Entre agosto de 2007 e agosto de 2008, mantive um blog chamado boneca. Era um espaço pequeno, mas cheio de carinho, onde experimentei formas de escrita entre a ficção, o rabisco, o poema e o silêncio. Um canto à parte, costurado como um bolso secreto dentro do meu antigo site/blog trecosetrapos. A descrição era simples: Boneca de linha ultrapassada, contação. E isso dizia tudo. Era sobre inventar, errar, brincar com palavras, criar cenas curtas e personagens esquisitos, dar voz a pequenos absurdos e emoções costuradas à máquina de escrever da memória. A identidade visual do blog também tinha seu charme. Era simples, com pontos de cor alinhados como miçangas e um cabeçalho que até hoje é um dos meus favoritos. A imagem da boneca antiga, em tom rosado, segurando um ursinho, dava o tom delicado e nostálgico que atravessava também os textos. Como se tudo fosse feito à mão, entre linhas e retalhos de sentimento. Lá, eu falava de caminhos…
.boneca
Encontro
Atravessou a rua com pressa, sem nem olhar para os lados. Caminhou de encontro aos transeuntes e seguiu afobada. Com o coração na mão. Entrou naquela livraria pequenina na esquina. Encontrou quem procurava. Olhou, se aproximou e abriu timidamente a boca para dizer “oi”. A resposta veio com surpresa. Oi! Beijaram-se. Nada mais importava.
Separação
Tem que ser bem pensada, bem planejada. Para onde ir depois de tudo? O que levar. Deixar o quê? A lei diz que tem que dividir. Eu não quero. Só quero meus livros, discos e filmes. Mais nada. O resto é lembrança em forma de cozinha, máquina de lavar roupa suja. Não pode voltar para os braços da mãe, é desonroso. É descumprir promessa feita. Acaba pensando que casar é mais fácil que descasar. Pra casar basta o sonho, o amor. Pra descasar só ódio não basta. Na verdade, é melhor que não exista tal sentimento, torna tudo mais difícil. A facilidade já não é parte da vida desde muito tempo. Agora as responsabilidades existem para além da turma do teatro ou da escola. Emprego que paga pouco, faculdade que exige muito. Lamentação tem período certo para acontecer. Depois tem que encubar, deixar guardado o sentimento e seguir em frente. Mesmo que seja sem lenço e sem documento. Construir vida…
andanças [3]
Na madrugada uma chuva fina começa a cair lá fora, Rubens cai no sono. Em meio a sonhos estranhos envoltos em um lençol branco, ele acorda. O apartamento continua vazio. Em um rompante levanta e vai até a geladeira e bebe água, um gole atrás do outro. Depressa. O Sol não demoraria a chegar e um novo dia batia a porta. Ele senta em uma cadeira e fita demoradamente a cesta de pão vazia. O dia vai raiando. Ele veste um casaco e sai, desce as escadas devagar e quando chega lá embaixo se dá conta de que esqueceu as chaves do portão do prédio. Volta para o apartamento, e ao chegar lá em cima desiste de sair. Não havia motivos para sair, eram seis da manhã. Não haveria nada aberto, a não ser os botecos da cidade com um bando de bêbados atazanando. Contenta-se com algumas bolachas escondidas no fundo do armário. Estavam velhas. Também pudera, elas eram do…
Chuva
Não venha me dizer que pode viver de Sol. Porque hoje está chovendo e não há sinais de que vá parar tão cedo!