Lendo

Morgan: O único, de Douglas Eralldo

Morgan: O único é o livro de estréia de Douglas Eralldo. Morgan, o protagonista, é um zumbi que conta sua história. Ele narra como foi se transformar em zumbi e como foi encontrar a pequena cidade (que fica claro ser do Rio Grande do Sul) em que vivia e tudo que aconteceu depois de ter levantado da própria tumba. Uma ideia interessante e o maior mérito do livro, e apesar de não ser o primeiro defunto a narrar sua história na literatura nacional, é o primeiro a narrar os post morten (pelo que tenho conhecimento). Morgan é um zumbi diferente, aliás, bastante diferentes dos zumbis a que estamos habituados.

Morgan tem consciência do que é e do que faz. Ele consegue pensar e articular estratégias tanto para encontrar sua cidade, quanto para fugir ou procurar certas pessoas. No entanto, o próprio Morgan/narrador afirma o tempo todo como os zumbis são burros e não pensam: ele tem cérebro, ao passo que os zumbis criados por ele ao se deliciar com o cérebro alheio não o tem, apesar do clichê de filme de comédia sobre zumbis, faria sentido se ele não se incluísse entre os zumbis com falta de uma inteligência mínima. O que acaba tirando muito da credibilidade da própria narração. Se o autor suprimisse essas passagens acredito que esse problema estaria resolvido.

No entanto, as reflexões de Morgan conseguem ser bastante pertinentes em muitas passagens do livro, mostrando uma reflexão sobre o mundo em que vivia. Muitas delas dedicadas à paixão de infância, uma jovem que, descrita fisicamente em demasia, some em determinado ponto e ficamos sem saber o que ocorreu com ela. Talvez o mistério seja interessante, mas fato é que o sumiço pareceu uma falha no texto e não uma questão de estilo ou parte da trama.

Apesar do assunto que me fascina, eu não apreciei o livro como gostaria. Como fã de zumbis, achei a história mal contada, sem motivação e sem a adrenalina típica das histórias de mortos-vivos. Além da percepção de gosto pessoal, acredito que faltou revisão no texto, não de gramática ou ortografia, mas da própria construção textual. A obra possui incoerências e erros de continuidade (como a descrição e uso dos dentes do personagem que muda conforme a situação em que Morgan se encontra) que prejudicaram a narrativa e a suspensão da realidade necessária para prender o leitor na história. E a inserção de algumas passagens foi totalmente desnecessária e mais atrapalhou do que ajudou no texto de Eralldo, como por exemplo uma explanação sobre o motivo de não gostar de horário de verão jogada no meio do texto. Apesar de prometer uma história muito bacana, não convence devido a falta de concretude em alguns pontos da narrativa.

Eu entendo que é o primeiro livro do autor e ressalto a originalidade e a potencialidade dele, mas acho que faltou maturar um pouco mais a ideia e o próprio texto.

Morgan: O único
Autor: Douglas Eralldo
Editora Literata
Skoob
Páginas: 160
Ano: 2011

Esta resenha faz parte do projeto Zumbi Errante, o Book Tour promovido por Douglas Eralldo para divulgar seu livro.

Anarca, feminista, vegana, cat lady, bookworm, roller derby, hiperbólica, entusiasta das plantas e constante aprendiz. Rainha de paus, professora de história, amante de histórias. Meu peito é de sal de fruta fervendo num copo d'água. ♀️✊Ⓥ

Subscribe
Notify of
guest

14 Comentários
Oldest
Newest Most Voted
Inline Feedbacks
View all comments
Monica Carneiro
12 de julho de 2011 10:01 pm

Oi Dani, ,muito chato quando a gente se depara com um livro assim. Pura decepção!!
É uma pena que ocorra isso e pior a gente tem que dizer ao público, pois é a reputação que defendemos. adorei a resenha.
Beijos

Álisson Zimermann
13 de julho de 2011 9:19 am

Bom Daniela. Permita-me discordar de você. Ao que parece o pouco tempo que ficou com o livro não te permitiu entendê-lo.
Ao que é citado sobre os zumbis serem burros, e ele não ser, é que ele permaneceu com seu cérebro, coisa que os zumbis ‘burros’ não tinham (e perceba se eles ‘pensam’), e ainda quem manteve metade do seu ainda conseguia ter alguma consciência.
Quanto à incoerência realmente não faço ideia do que tu pode ter pensado, pois cada capítulo traz para outro em uma sincronia interessante. A única coisa que foge disso são os capítulos onde o personagem reflete sobre sua natureza, o que faz o livro ser além de um livro de histórias, também um debate sobre o comportamento humano.
É uma pena mesmo um blog deste tamanho ter uma visão tão ínfima sobre esta boa obra nacional.
Infelizmente não é a credibilidade do livro que foi abalada =(
Abraços.
Álisson

Álisson Zimermann
Reply to  Daniela
14 de julho de 2011 9:48 am

@Daniela, Oi dani, tudo legal?
Olha só… eu entendo que o intuito não foi denegrir a obra e também acho abominável que as pessoas elogiem a obra simplesmente por ‘convenção’… Eu só critiquei pelo fato de que realmente tu não dá nenhum embasamento público às criticas. Apenas lança no ar que tem problemas e erros, trazendo assim para quem lê tua opinião a ideia de que nada está certo e que tudo está errado.
Só penso que quando as críticas são levantadas, é interessante desenvolver a ideia para não afastar aquele leitor que ainda não tem a obra, pois da forma que foi feita apenas parece que, como eu citei, são críticas sem fundamento, lançadas por alguém que não entendeu o texto.
Desculpe, mas não considero uma resenha ‘crítica’, e sim uma ‘resenha que critica’ a obra, baseado nos apontamentos que fiz acima.
Obrigada pela resposta.
Abraços

Douglas Eralldo
14 de julho de 2011 3:44 pm

Querida Daniela,
Primeiramente agradeço a participação na promo Zumbi Errante, e da mesma forma por compartilhar com seus leitores a impressão [e mantendo-se fiel a elas] que teve do livro;
Um escritor pode até discordar de uma resenha, e em alguns pontos de seu texto tenho minhas divergências quanto sua análise, mas jamais deve deixar de respeitar a opinião sincera de um leitor, e por isso saiba que respeito muito suas palavras, e em alguns pontos pensamos da mesma forma.
O ato de escrever é prazeroso justamente pelo fato, que em cada pessoa despertamos diferentes sensações, e por isso cada leitor verá o livro de uma forma diferente que o outro;
E que Bom que Morgan tem despertado sentimentos diferentes e cada leitor que o conhece;
Um grande Abraço
Douglas Eralldo

trackback
16 de julho de 2011 10:42 am

[…] em: trecos&trapos Categorizado em:Literatura Com as Tags:Douglas Eralldo, Editora Literata, literatura nacional, […]

Douglas Eralldo
21 de julho de 2011 3:48 pm

Olá…
Vi que a resenha foi acrescentada de alguns pontos que contribuíram bastante para o embasamento da Daniela. As quais eu também gostaria de deixar alguns contrapontos, vejamos:
Quanto a Morgan considerar os zumbis como burros, ele de fato o faz… No entanto ele não está a dizer isso de si mesmo, pois como ele bem sabe, é um zumbi diferente e único…
E ai foi um calculo premeditado quanto ao risco que estou correndo. por fazer coisas muito diferente, obviamente haverá os que não irão gostar desta versão meio Chuck Norris… No entanto, esta incompreensão poderá ser maior se analisarmos Morgan sob a ótica de um zumbi fruto de ficção científica onde os mortos-vivos são bem limitados… No entanto Morgan é um ente sobrenatural… E aos entes sobrenaturais são reservados poderes incompreensiveis..
Quanto aos dentes… Bem isso eu terei de ver então, se me passou, ficou despercebido…
E quanto a Rebeca, seu desaparecimento é proposital e intencionado, pois antes mesmo de eu definir que escreveria uma segunda parte, confesso ter deixado pontas para vermos uma cruel e sagaz assassina de mortos…
Tanto é que deixo isso no ar quando não lhe dou um final “Vaguei por toda a cidade em busca de Rebeca. Jamais encontrei seu corpo, bem como a possível zumbi em que ela poderia ter se transformado…”
Sob sua descrição nos por menores, perdoem-me, mas zumbis te obrigam a usar certos clichês…
Espero que eu tenha ajudado a elucidar algumas dúvidas, e jamais isto deve ser visto como debate, ou tolhimento a opinião, apenas achei que seria interessante compartilhar o que como autor quis passar em algumas passagens…
att.

Douglas Eralldo
Reply to  Daniela
22 de julho de 2011 9:03 am

@Daniela, Capaz, como eu disse, o interessante é o debate… rsrsrsss…
Alias, como coloquei, sabia de forma premeditada deste debate sobre zumbis, e é justamente isso que espero dos leitores, que tambem discordem, pois sempre tive por filosofia que são nas divergencias que o mundo avança…
O mais legal que esse debate coloca os zumbis em questão, pois estas criaturas tem uma farta história na literatura…
Um abraço

trackback
28 de julho de 2011 8:14 pm

[…] do livro: “Se tem zumbi no meio, só pode ser bom”. Acho essa frase muito verdadeira, com raríssimas exceções. E Areia nos Dentes definitivamente não é uma excessão. O livro está aí para confirmar que […]

trackback
17 de outubro de 2011 9:14 pm

[…] muito ler, estava sempre procurando informações sobre ele e tinha muitas expectativas sobre foi Morgan: O Único, de Douglas Eralldo. Pela sinopse eu esperava um livro incrível, afinal como um livro sobre zumbis poderia ser ruim? […]

trackback
30 de dezembro de 2011 7:31 am

[…] livro que me decepcionou: Morgan: O único, de Douglas Eralldo. Porque eu esperava muito de um livro sobre zumbis, e o livro não alcançou […]

trackback
27 de setembro de 2020 8:00 pm

[…] livro que me decepcionou: Morgan: O único, de Douglas Eralldo. Porque eu esperava muito de um livro sobre zumbis, e o livro não alcançou […]

14
0
Would love your thoughts, please comment.x