Teatro dos Lírios é o livro de estreia da escritora chinesa radicada na Holanda, Lili Wang. Não conheço a fundo a biografia da autora para afirmar (como alguns fizeram em suas resenhas) que ela conta sua história através do olhar Lian Shui, a menina de 12 anos que protagoniza o livro. Fato é que a história narrada por Wang é rica em detalhes e ganha muita força pelo seu plano de fundo histórico. Lian Shui é filha de uma professora de História e de um médico e ambos sofrem com as arbitrariedades da Revolução Cultural Chinesa. O pai é banido para uma província distante e a mãe vai para um campo de reeducação para burgueses (um campo de trabalhos forçados). Lian descobre que tem vitiligo e sua mãe a leva para o campo para que a menina não ficasse sozinha e sofrendo preconceito por sua doença no internato para o qual foi mandada depois da punição de seus pais ser executada.
O livro é dividido em quatro partes nas quais as duas primeiras narram a vida de Lian no campo ao lado de sua mãe e de outras centenas de professores, médicos, psicólogos e outros diversos profissionais considerados intelectuais e, portanto, perigosos para o regime de Mao Tsé-Tung e o momento imediatamente anterior a esse, quando ela conhece e tenta desesperadamente ajudar e ser amiga de uma menina da última casta (a mais baixa de todas). A narrativa é um pouco diferente, eu nunca tinha lido nada de um autor oriental antes e fiquei bastante surpresa com a delicadeza e todas as sutilezas que uma autora chinesa pode trazer para o texto. No entanto, a leitura acabou sendo diferente, mais lenta para ser sincera. Falta de costume, talvez, mas tenho que admitir que a leitura não fluiu tanto quanto eu gostaria e demorei muito mais do que o normal para ler o livro. Esse estranhamento inicial não se dissipou conforme a leitura transcorria apesar da quantidade de páginas e do tempo que fiquei com o livro nas mãos, infelizmente.
As duas primeiras partes narram uma história contínua e que faz o leitor refletir junto com Lian sobre as transformações pelas quais ela está passando, sobre tabus da sociedade chinesa e sobre a política, a corrupção, a dominação e o sentido do contexto histórico que vivia. As aulas de história que Lian teve no campo com um dos professores que lá trabalhavam foi uma das coisas que mais gostei do livro, pois essas aulas não repetiam os ensinamentos que ela teve desde que nasceu e olhava para a história da China de maneira crítica, sem idealizar um país e um partido que suprisse todas as necessidades físicas e espirituais da população como era ensinado para todos na escola durante o regime de Mao. Puxando brasa para o meu assado, as aulas de história são realmente um dos pontos altos do livro, principalmente porque elas falavam muito de teoria da história e do raciocínio histórico e não de um empilhado de fatos de milênios de história chinesa.
Porém, se as duas primeiras partes contaram uma história, as duas últimas pareciam mais um amontoado de fatos da vida cotidiana da protagonista (com exceções de alguns trechos, é claro) contados aleatoriamente. As aulas, os ensinamentos, os ideais, a doença e boa parte do contexto ficam de lado. Tudo bem que muitos fatos cotidianos ajudaram a entender as transformações pelas quais a jovem estava passando e faziam parte de seu aprendizado, mas a impressão geral era de que eles estavam ali para encher linguiça. Além disso, a personagem Kim, melhor amiga de Lian e provável/possível namorada da menina sofre uma transformação muito brusca que me decepcionou um pouco.
Durante toda a terceira parte do livro esperei por uma mudança no relacionamento das duas e o que aconteceu além de ter sido o oposto do que esperava, foi um balde de água fria na minha leitura (não que o que eu queria devesse ocorrer). E o final do livro também foi um pouco decepcionante, a sequência de fatos relatados que culminam com o final quase apoteótico foi muito rápida e tirou um pouco o tesão de ler o livro. Tanta coisa aconteceu que poderia ser melhor explorada, que me deixaram com gostinho de quero mais e que poderiam ser melhor trabalhadas até para que o final tivesse mais efeito. Mas não. Foi tudo atropelado e o final ficou meio perdido, sem sentido e me desapontou enquanto leitora.
A história como um todo é muito bonita, possui pontos fortes que valem quase pelo livro todo, mas as duas partes finais (com exceção de alguns capítulos maravilhosos) deixaram muito a desejar. Não diria que o livro poderia ser reduzido às duas primeiras partes, pois os acontecimentos narrados nas partes finais são bastante importantes, mas minha impressão é de que eles foram se encaixando mal no quebra-cabeças da narrativa.
Teatro dos Lírios
Lulu Wang
470 páginas
Editora Record
Goodreads | Skoob | Submarino
[xrr rating=2.5/5]
A resenha mais atrasada de todas, mas a leitura foi feita em dia. Esse texto faz parte do projeto de blogagem coletiva Desafio Literário 2012. A resenha corresponde ao mês de Abril, cujo objetivo é ler um livro de um escritor oriental.
Confira no blog do desafio as resenhas dos outros participantes para este mês. Ou descubra quais foram as minhas escolhas.
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Confira as leituras feitas para o Desafio Literário 2012:
Janeiro – Literatura Gastronômica: Julie & Julia: 365 dias, 524 receitas e 1 cozinha apertada, de Julie Powell.
Fevereiro – Nome Próprio: Frankenstein, de Mary Shelley
Março – Serial Killer: Abril rojo, de Santiago Roncagliolo
Abril – Teatro dos Lírios, de Lulu Wang
QUe livro interessante, me chamou demais a atenção, vou anotar pra ler. QUe legal vc ta conseguindo seguir direitinho o desafio literário, infelizmente nao to conseguindo, mas mesmo assim ainda nao desisti =D